segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O perigo da "vista grossa" na Educação

     As aulas ainda nem recomeçaram e uma polêmica já toma conta da Educação no Rio Grande do Sul. Na última quarta-feira (16/02), o secretário estadual de Educação, Jose Clovis de Azevedo, anunciou que o estado irá adotar, a partir deste ano letivo, uma medida homologada pelo Ministério da Educação no ano passado, que acaba com a reprovação até o terceiro ano do ensino fundamental. O novo sistema será adotado por todas as escolas estaduais e terá implantação gradual, para que as escolas substituam as séries iniciais pelo chamado ciclo de Alfabetização e Letramento. A rede municipal também terá que adotar o método, mas levará mais tempo para completar a troca.
     Jose Clovis defende a não reprovação como forma de reduzir a exclusão precoce dos estudantes e estimular o desenvolvimento educacional por um período prolongado. "Esse é o caminho para que a escola não antecipe a exclusão pelo processo de repetência. Quem tem vivência em escola pública sabe que o investimento nas crianças por mais tempo permite que ela siga em frente. Reprovar no início afasta o aluno", declarou o secretário em depoimento ao jornal Zero Hora.
     A ideia parece positiva se forem observadas as taxas de abandono escolar, cujos índices são mais altos entre alunos que reprovaram nos primeiros anos de escola. Defensores do novo método afirmam que os professores teriam mais tempo para identificar pontos deficitários no ritmo de aprendizagem de cada aluno e trabalhá-los com maior foco. Mas a aceitação está longe de ser unânime.
     A ex-secretária de Educação da Capital e presidente do Grupo de Estudos sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação (Geempa), Esther Grossi, declarou à ZH que a medida estará "empurrando muitos brasileiros ao analfabetismo (...), os quais sairão cegos para nossa língua escrita". Esther acredita ainda que o sistema apenas retarda a reprovação que virá nos anos seguintes. Ou seja, a polêmica apenas começou a ser escrita.
Secretaria Estadual da Educação decidiu adotar o fim da reprovação até o terceiro ano do ensino fundamental, recomendado pelo MEC

     O que particularmente me preocupa neste novo sistema é a abertura de uma brecha para que a "vista grossa" se instale na Educação gaúcha. O fim da reprovação até o terceiro ano pode criar uma zona de conforto perigosa, tanto para docentes quanto para discentes. A garantia de aprovação pode frear os respectivos ímpetos em ensinar e estudar. Seria o popular "professor finge que ensina e aluno finge que aprende".
     Naturalmente, isso seria falta grave na conduta profissional de um professor, mas é mais fácil de acontecer do que se imagina. Ainda mais se pensarmos nas precárias condições de trabalho e na baixa remuneração dos professores gaúchos.
     Não precisa ser especialista em educação para saber que cada criança tem um ritmo diferente de aprendizagem, como facilidades e dificuldades que variam caso a caso. Assim como o secretário Jose Clovis, eu também acredito que um período maior de atenção aos problemas de cada aluno aumenta as chances de melhorar o rendimento escolar. A questão como garantir que esse tempo extra seja realmente aproveitada. É como estar em férias, ganhar uma semana a mais de folga e ficar todos os dias trancado em casa. Você não terá aproveitado nada.
     Minha opinião é que o desafio do governo e das escolas não está na implantação do novo sistema, e sim na criação de mecanismos que garantam controle, avaliação e efetividade ao método, além de afastar o fantasma da vista grossa das salas de aula. Tenho expectativa que a secretaria conseguirá promover um processo de discussão amplo para a construir esses mecanismos, com a participação ativa de especialistas e da categoria docente. Mas isso não acontece de uma hora para outra, por isso a mobilização deve ser imediata.
     É claro que de nada servirão os instrumentos de controle e o esforço dos professores se os pais e responsáveis não assumirem o protagonismo na educação das crianças. Será preciso estar cada vez mais presente na rotina escolar de seus filhos, para ajudá-los a identificar suas maiores dificuldades e buscar, junto com os professores, a melhor forma de resolver o problema. Essa colaboração é indispensável para promover a mudança significativa que o sistema educacional do Rio Grande do Sul tanto precisa.

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